O homem que engarrafava nuvens

Filme

Texto de Walter Sebastião sobre o filme “O homem que engarrafava nuvens”, que conta a história de Humberto Teixeira, parceiro de Luiz Gonzaga, o compositor cearense pôs a música nordestina no coração dos brasileiros.

*Link enviado pelo PC do Acordeon.

Pode-se dizer que o Brasil tem três hinos: o oficial (Joaquim Osório Duque Estrada-Francisco Manuel da Silva), Carinhoso (Pixinguinha-João de Barro) e Asa Branca (Luiz Gonzaga-Humberto Teixeira). Não há brasileiro que não conheça essas composições e, ao ouvi-las, não se sinta tocado. O reverenciado filme O homem que engarrafava nuvens é estrelado pelo autor do clássico do baião Humberto Teixeira (1910-1974). Dirigido por Lírio Ferreira, o longa-metragem chega aos cinemas no dia 15.

Humberto assinou, entre outras, Assum Preto, Como se dança o baião e Paraíba mulher macho – sucessos na voz de Luiz Gonzaga. Cearense e apaixonado pela cultura nordestina, queria estudar piano, mas o pai vetou: era instrumento “de moças”. Ele acabou se dedicando à flauta e, mais tarde, formou-se em direito. Mudou-se para o Rio de Janeiro aos 16 anos e, ao lado do parceiro, pôs a música do Nordeste para tocar no Sul.

No filme, Humberto Teixeira e o baião são reverenciados pelas maiores personalidades da MPB. Chico Buarque arrasa, cantando Xanduzinha. Foi por meio do cearense, explica Gilberto Gil, que o gênero se tornou “uma das duas dinastias da música nacional” (a outra é o samba). Caetano Veloso avisa: por baixo do tropicalismo, que fundiu pop rock e canção brasileira, está o baião. Ele conta que, em Terra, quando fala na Paraíba, está conversando com Humberto Teixeira. Raul Seixas se autodefine como filho do baião com Elvis Presley. Lirinha, do grupo Cordel do Fogo Encantado, relembra história hilariante, ouvida do Maluco Beleza: Bob Marley inventou o reggae depois de ouvir um velho LP de baião.

O homem que engarrafava nuvens ganhou vários prêmios em festivais brasileiros. “Informação, a gente tem em excesso, mas formação é pouca”, afirma Lírio Ferreira. Informar remete a dados, do tipo como onde nasceu alguém, seus discos, etc. Formação, por sua vez, implica descobertas, novos horizontes que provocam o pensamento. “Coloco Humberto Teixeira e o baião em contexto amplo”, afirma o cineasta. O contexto do filme, com fotografia de Walter Carvalho, é a 2ª Guerra Mundial, a industrialização brasileira e a migração dos nordestinos, mas também o surgimento do tropicalismo e os ecos nacionais e internacionais desse movimento.

A fita traz aula inaugural de MPB – densa, longa, surpreendente e repleta de depoimentos e imagens preciosos. Com direito a David Byrne, ex-Talking Heads, cantando Asa Branca em inglês – autêntica candidata a hino na luta contra o aquecimento global. “As letras de Humberto Teixeira são completamente cinematográficas. Poesia pictórica, criando quadros da infância dele”, explica Lírio Ferreira, lembrando que o autor era adolescente quando deixou a sua terra, mas escreveu, de memória, extensa e minuciosa crônica da vida e do sentimento popular.

Se Cartola, a primeira incursão de Lírio no documentário musical, é “preto e branco”, lunar, O homem que engarrafava nuvens “é laranja, quente, solar e explode em cores”, observa o diretor. A música, ressalta, é elemento importante em todos os seus filmes, “não como pano de fundo, mas batendo de frente com a imagem”. Subscrevendo a afirmação do colega Rogério Sganzerla, diz que “a música é a melodia do pensamento”. Faria mais um filme sobre o assunto? “Talvez sobre o pop brasileiro dos anos 1980, sobre Raul Seixas, Erasmo Carlos, Clube da Esquina, Tim Maia e Chico Science”, responde.

Lírio Ferreira é do Recife. Levam a assinatura dele os elogiados longas Baile perfumado, em parceria com Paulo Caldas, e Árido movie. A forte presença musical em seus trabalhos, suspeita, deve-se a Pernambuco. “Somos o terceiro estado com mais índios no país, os negros vieram trabalhar nos engenhos de açúcar, tivemos a cultura portuguesa do século 17 e intelectualidade burguesa importante. Hoje, existe um bando de aloprados e desvairados misturando tudo isso”, brinca.

Filha única de Humberto Teixeira, Denise Dummont é produtora do longa. Admirada, cita o cuidado dedicado por Ana Jobim à obra do marido, Tom Jobim, enquanto ela mal conhecia a obra do pai. O bloqueio, suspeita, deve-se ao fato de Humberto ser homem reservado, severo, “um machão”, que, segundo Denise, não deixava a filha namorar nem seguir a carreira artística. Diz que nunca conheceu realmente o pai, apesar de ter sido criada por ele. Cena forte do longa é a conversa de Denise com a mãe, Margarida Jatobá, que deixou o marido exatamente por causa do temperamento dele.

“Saí buscando meu pai e descobri o Brasil”, revela Denise Dummont, contando que o filme mudou sua visão sobre o país. “Adolescente criada em Ipanema, ouvindo Chico Buarque e Rolling Stones, achava baião cafona e não tinha ideia da riqueza cultural do Nordeste”, explica. Nem sequer conhecia a região onde Humberto Teixeira nasceu. “Descobri a beleza, a força e a dignidade do nordestino e do baião. Sobretudo, o quanto a minha visão era limitada.”

Denise é só elogios para personagens de O homem que engarrafava nuvens. Como os Irmãos Aniceto, músicos. Ou Mestre Expedito, filho do homem que fazia as roupas de Lampião, cujas alpargatas foram usadas em desfile parisiense do estilista Alexandre Herchcovitch. Ela chama a atenção para o Coco de Dona Edite, grupo musical e de dança formado por camponesas.

“Na minha opinião, todos – crianças, adultos e idosos – deveriam ver este filme, porque faz bem à autoestima. Durante as filmagens, ficava me perguntando por que o baião e as canções de Humberto Teixeira e de Luiz Gonzaga sobreviveram, são cantadas em escolas de crianças. A resposta é: porque são coisas verdadeiras”, afirma. O que teria ela descoberto sobre o pai? “Era um homem de sensibilidade absurda, autor de letras e músicas excepcionais. O Nordeste estava impregnado nele. Resgatei o respeito e a admiração pelas criações de meu pai, que, perua de Ipanema, eu não conhecia e entendia”, brinca. Denise recomenda: quem quiser saber mais sobre Humberto Teixeira deve ouvir o disco Doutor em baião (Biscoito Fino) e consultar o livro Cancioneiro de Humberto Teixeira.

Guadalupe

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*Foto enviada pelo Thiago dos Santos

3 do Xamego & Banda – Do jeito que eu quero

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Colaboração do Lourenço Molla, de João Pessoa – PB.

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Um disco da década de 1990, já lançado em tres formatos diferentes de mídia, o recém chegado CD, o tradicional LP e as famosas fitas K-7.

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Gravado em 16 canais, em Natal – RN, produção e direção musical de Carlinhos, arranjos e acordeon de Zé Cardoso, zabumba de Miudinho, um disco muito bom, mas seria bem melhor se a bateria não estivesse tão evidente na mixagem.

3 do Xamego & Banda – Do jeito que eu quero
1994 – Colibri

01 Forró dengoso (Pinto do Acordeon)
02 Forró do mexe-mexe (Manoel Vidal)
03 Xodó mulher (Arimatéia – João de Oliveira)
04 Louco por você (Zezinho do Vale – Zé Cardoso)
05 Escravo do amor (Arimatéia – João de Oliveira)
06 Pensando em você (Miudinho – Zé Inácio)
07 O presente (Arimatéia – Zé da Ema – Duda)
08 Flor maravilhosa (Zé da Ema – Arimatéia)
09 Menina bonitinha (Arimatéia – Miudinho – Zé Cardoso)
10 Do jeito que eu quero (Manoel Vidal – Rosângela – Raoni)

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