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Alceu Valença – Cavalo de pau

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Alceu Paiva Valença, nascido em São Bento do Una – PE, no dia 01 de julho de 1946. Influenciado inicialmente por Jackson do Pandeiro, Luiz Gonzaga e Marinês. E em casa, a formação ficou por conta do avô, Orestes Alves Valença, que era poeta e violeiro.

Aos 10 anos foi para Recife, onde manteve contato com a cultura urbana. Recém-formado em Direito no Recife, em 1969, desistiu das carreiras de advogado e jornalista e resolveu apostar no talento e na sensibilidade artística. Sua música e seu universo temático são universais, mas a sua base está na nordestinidade.

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É considerado um artista que atingiu maior equilíbrio estético entre as bases musicais nordestinas com o universo dos sons elétricos da música pop. Por conta disso, conseguiu dar nova vida a uma gama de ritmos regionais, como o baião, coco, toada, maracatu, frevo, caboclinhos e embolada e repentes cantados com bases rock’n’roll. (Trechos extraídos do Wikipedia)

Destaque para as versões originais de músicas que se tornaram hinos para várias gerações, como “Tropicana”, “Como dois animais” e “Pelas ruas que andei”.

Alceu Valença – Cavalo de pau
1982 – Ariola

* 01. Rima com rima (Alceu Valença)
* 02. Tropicana (Alceu Valença – Vicente Barreto)
* 03. Como dois animais (Alceu Valença)
* 04. Pelas ruas que andei (Alceu Valença – Vicente Barreto)
* 05. Martelo alagoano (Alceu Valença)
* 06. Lava mágoas (Alceu Valença – Dominguinhos)
* 07. Cavalo de pau (Alceu Valença)
* 08. Maracatú (Ascenso Ferreira – Alceu Valença)

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CD – Luiz Amorim – Forró For All

Colaboração do Lourenço Molla, de João Pessoa – PB.

Luiz Carlos Amorim, nascido em 22.11.1968 em Solonópole – Ceará.

Embora esteja sem a data, acreditamos que o disco é de 2018 ou 2019.

 Luiz Amorim – Forró For All

01 Encosta Neu (Cassio Sampaio)
02 Meu Cenário (Petrucio Amorim)
03 Se Avexe Não (Acioly Neto)
04 Por Falar Em Amor (Luiz Amorim – Marcos Buzana)
05 Vá Tomando Mé (Domingos Pessoa)
06 Taxi Lunar (Geraldo Azevedo – Zé Ramalho – Alceu Valença)
07 Sonho Brinco (Luiz Amorim)
08 Lua (Domingos Pessoa)
09 Casinha Branca (Gilson – Joran)
10 Eu só quero um Xodó (Dominguinhos – Anastácia)
11 Até mais vê (Se Eu Morasse Aqui Pertinho) (Pedrinho – Primo)
12 Saudade De Você (Elifas Junior)

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Cap00 – Apresentação – Livro – O que é o Forró? (2022)

Toda raiz vem da semente

A mistura das raças no Brasil permitiria, ao longo dos séculos, o surgimento de uma cultura musical sem similaridades no restante do planeta, adornada por qualidades rítmicas, melódicas e poéticas, resultando numa diversidade de gêneros que embalam e encantam gerações. O forró é uma das árvores desse pomar sonoro.

Enraizado no nordeste brasileiro, o estilo e suas variáveis conquistaria o país e o mundo a partir do surgimento da indústria fonográfica e da “urbanização” de um cancioneiro essencialmente rural, disseminado por talentosos e desbravadores artistas, em períodos e feitos variados, a exemplo de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Marinês, Abdias, João do Vale, Dominguinhos, Sivuca, Jacinto Silva, Elino Julião, Genival Lacerda, Pinto do Acordeon, Anastácia, Nando Cordel, Maciel Melo, Elba Ramalho, Alceu Valença, Zé Ramalho, Geraldo Azevedo e uma gama de outros intérpretes, compositores e grupos (como o inigualável Trio Nordestino e as eternas marchinhas de Antônio Barros), que têm no forró tradicional o principal nutriente de suas bem sucedidas trajetórias, semeando vivências, memórias e muito forrobodó. Germinando arte na aridez do mercado.

Nesta cartilha, voltada para um público iniciante nos ritmos e danças do balaio forrozeiro (baião, coco, rojão, arrasta-pé, xaxado, xote, entre uma gama variada de outros toques e passos), os pesquisadores, músicos e produtores Ivan Dias e Sandrinho Dupan reuniram dados e experiências, misturando batidas e movimentos com elementos históricos, essenciais a uma compreensão básica sobre o assunto. Jogam sementes no ar.

Tema complexo e abrangente, o forró ganha uma trilha segura aos que desejam, além de ouvir, dançar e cantar, entender um pouco sobre o fascínio que as músicas do cardápio nordestino exercem sobre homens e mulheres que se deixem abraçar por seus longos galhos sonoros, sensoriais e solenes: um trio de emoções garantidas.

Basta soprar a agulha, rodar o disco e passar os olhos.

Fernando Moura (Jornalista e escritor)

Parte do livro: O que é o Forró? Um pequeno apanhado da história do Forró./ Ivan Dias e Sandrinho Dupan. 2022 ISBN978-65-997133-0-9
Projeto contemplado pela 2a Edição do Fomento ao Forró, da “Secretaria Municipal de Cultura” da cidade de São Paulo.

Baixe gratuitamente o livro completo em PDF: Clique Aqui.

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Cap16 – Forró MPB (década de 1970) – Livro – O que é o Forró? (2022)

O Forró tradicional sempre existiu, mas teve seus altos e baixos. Durante a década de 1960 foi sufocado por outros estilos musicais, como a Bossa Nova, o Iê-iê-iê, o Rock e o Jazz. Teve uma nova ascensão com a chegada dos artistas do “Forró MPB” (Música Popular Brasileira).
Forró MPB (década de 1970)
Artistas jovens, com influências do Forró Tradicional e a ousadia própria da idade, misturaram o Forró com as tendências musicais da época, como o Rock, por exemplo, resgatando o gênero para o cenário artístico e os holofotes da mídia.
Um período caracterizado pelo aumento da complexidade da arquitetura melódica e harmônica nas gravações. Esses jovens renovam o interesse nacional pelo Forró, atraindo novos olhares com composições revolucionárias e resgatando os ícones das décadas anteriores.
Certa vez, Alceu Valença, quando de passagem por Pernambuco, resolveu dar uma “passada” em Exu para conhecer o Rei do Baião. A visita rendeu uma gravação juntos.
Uma outra interação de gerações notória foi quando Geraldo Azevedo e Alceu Valença bateram à porta de Jackson do Pandeiro para conhecê-lo e convidá-lo para participarem juntos de um festival de música.

Já na década seguinte, de 1980, o Forró perderia novamente espaço para a música estrangeira e suas variáveis nacionais, como Rock, Baladas Românticas, música Brega (ou de “Roedeira”) e Lambada, basicamente fenômenos de mídia e seus espectros seletivos. Os bons ficaram, os maus passaram e os antigos hibernaram outra vez.
Com essas influências, escreve-se um novo capítulo na história do Forró, com o surgimento das grandes bandas e seus pragmatismos estéticos e parafernálias sonoras.

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Cap16.1- Principais Artistas do Forró MPB – Livro – O que é o Forró? (2022)

 Quinteto violado (1972)
 Fagner (1973)
 Banda de Pau e Corda (1973)
 Alceu Valença (1974)
 Zé Ramalho (1975)
 Xangai (1976)
 Amelinha (1977)
 Geraldo Azevedo (1977)
 Elba Ramalho (1979)
 Chico Cesar (1995)

Parte do livro: O que é o Forró? Um pequeno apanhado da história do Forró./ Ivan Dias e Sandrinho Dupan. 2022 ISBN978-65-997133-0-9
Projeto contemplado pela 2a Edição do Fomento ao Forró, da “Secretaria Municipal de Cultura” da cidade de São Paulo.

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Marinalva e sua Gente – Texto de Érico Sátiro

Marinalva e sua Gente – Texto de Érico Sátiro

 

Campina Grande, 1948. Dona Donzinha cuida em casa de sua filha Maria, nascida às vésperas das festas juninas. Enquanto acalentava a então caçula e cuidava dos outros pequenos, a mãe ouvia a filha mais velha, Inês, pedir autorização ao pai para ir ao cinema com o irmão Ademar. Com o consentimento de Seu Manoel, Inês saía de casa com o irmão, mas não para ir ao cinema, e sim à rádio fazer o que mais gostava: cantar. Escapando da rigidez do pai, que não queria saber de cantora na família, assim surgiu o talento de Inês, que se tornou a famosa artista Marinês, a “Rainha do Xaxado”. O que Seu Manoel não esperava era que, além de Marinês, ele teria outra filha cantora, Maria, o bebê que estava em casa com a mãe enquanto a irmã dava seus primeiros passos na música. Mais tarde, ela ficaria conhecida como Marinalva.

O surgimento musical das irmãs não foi fácil. O universo dos cantores nordestinos, desde o seu início, foi dominado pelos homens, assim como na grande maioria das classes trabalhadoras brasileiras do século passado. Eram muitos “reis” para poucas “rainhas”. Devagarzinho, no entanto, e superando preconceitos, elas começaram a surgir. Carmélia Alves, Marinês, Anastácia, Hermelinda, Clemilda e Elba Ramalho são algumas que constam em qualquer lista de mulheres forrozeiras, com seus baiões, xotes e xaxados, entre outros ritmos. Marinalva, apesar do grande talento, vem sendo injustamente esquecida, tanto que não há praticamente nada sobre ela em livros ou mesmo em textos na internet (os poucos que existem trazem informações desencontradas).

Ao contrário da irmã mais famosa, que era natural de São Vicente Ferrer/PE, Marinalva (Maria Caetano de Oliveira) nasceu em Campina Grande/PB em 10/06/1948, sexta dos nove filhos (quatro homens e cinco mulheres) de Seu Manoel (Manoel Caetano de Oliveira), mecânico e armeiro, e de Dona Donzinha (Josefa Maria de Oliveira). Em Campina, cresceu nos bairros Liberdade e Quarenta e, curiosamente, era chamada pelos parentes próximos por outro nome. “A gente a chamava de Consuelo ou de Maria Consuelo. A origem do apelido eu não sei não. Depois foi que ficou Marinalva mesmo”, explica o irmão Sussuanil, zabumbeiro, que atualmente reside no Rio de Janeiro/RJ e ainda atua em forrós junto com seu irmão Lourival (ambos tocaram muito tempo com Marinês). O apelido definitivo – Marinalva – só viria no início da carreira profissional, por sugestão do músico e produtor Abdias, então marido de Marinês, referência clara para o surgimento desse nome artístico (o “e sua gente”, acrescentado a Marinês por ideia de Chacrinha, também foi incorporado por Marinalva).

Oficialmente, a data de nascimento de Marinalva, constante em certidão de registro, é 10/02/1948, mas a cantora também possuía documentos com a data de 10/06/1948. Em razão do testemunho de seus familiares, que confirmaram que o aniversário dela era comemorado em 10/06, presume-se que houve um erro quanto ao mês em sua certidão de nascimento.

Não tendo encontrado, por parte de seu pai, a mesma resistência sofrida pela irmã mais velha para iniciar na música, a caminhada de Marinalva como cantora surgiu quando ela tinha cerca de 14 anos de idade, em programas de calouros, onde interpretava canções não apenas de forró, mas também de outros estilos, a exemplo de músicas do repertório de Ângela Maria. A carreira profissional se iniciou por volta de 1966, já sob o nome artístico de Marinalva e Sua Gente, fazendo apresentações em locais como circos, cinemas e rádios de Campina Grande e de outras cidades, como Recife, onde, naquele ano, foi uma das atrações do programa de auditório Comandos da Alegria, da Rádio Clube, em quadro que divulgava novos artistas. Foi uma das primeiras forrozeiras paraibanas a se destacar no cenário da música nordestina.

 

Década de 70

Seu primeiro disco veio em 1970, com o título Eu também sou de lá, lançado pelo selo Maraca, com destaque para faixas como “Jacaré dos Homens” (Elino Julião) e “O solteirão” (J. Cavalcante/Antônio dos Passos), que foi gravada no mesmo ano por Jackson do Pandeiro. Na canção que dá nome ao disco, de autoria de João Silva e J. B. De Aquino, a cantora se apresenta: “Nasci pra cantar/essa é minha sina/eu também sou de Campina/também quero xaxear”. Após ao lançamento do primeiro LP, Marinalva começou a ser convidada a participar de coletâneas diversas, inclusive assinando algumas canções. Os principais discos foram O fino da roça – vol. 3 (1971), Quermesse (1971), O fino da roça – vol. 4 (1972), Quermesse – vol. 2 (1972) e Fogo na geringonça – vol. 2 (1972), que incluíam músicas da cantora e de nomes como Zé Calixto, Antônio Barros, Messias Holanda e Genival Lacerda, amigo e conterrâneo que muito ajudou a cantora nesse período. Mas foi a partir de 1974 que a paraibana começou a criar discos mais marcantes. Em Poeira do Caminho (1974), gravado em São Paulo sob direção de Pedro Sertanejo, Marinalva mostrou sua qualidade com um bom repertório. Músicas como “Enquanto há vida, há esperança” (Antônio Penha/Wanderley Silva), “Eu vim de longe” e “O bom do xaxado” (ambas de Joca de Castro/Genival Lacerda) mostram a evolução da intérprete. Outro destaque, a toada “Poeira do caminho” (Joca de Castro/Genival Lacerda) apresenta uma das temáticas preferidas da cantora: o Nordeste, com suas belezas, seu povo, seus dramas e problemas.

Os outros dois álbuns gravados por Marinalva nos anos 70 comprovam que a década representou, musicalmente, a melhor fase de sua carreira, principalmente pela poesia nordestina contida em diversas letras. Com produção de Jackson do Pandeiro, a cantora lançou pela Chantecler/Alvorada os LPs Viva o Nordeste (1977) e Tardes Nordestinas (1978). Pra quem conhece a obra de Jackson, fica fácil perceber a semelhança na sonoridade desses discos com outros gravados ou dirigidos por ele naquela época, a exemplo de O Rei do Coco, do pernambucano Bezerra da Silva. Nesses álbuns de Marinalva, a cozinha percussiva do Rei do Ritmo é bem perceptível em faixas como “Vou me incendiar” (Raymundo Evangelista/J. B. de Aquino), “Retirante, não” (João Silva/J. B. De Aquino), “Eu vou pra Bahia” (Alba), “Chuva caiu” (Cecéu) e “Chega pra lá meu bem” (Ignácio Virgulino/Marinalva). “Tarde nordestina” (no singular, ao contrário do título do LP), de autoria de D. Matias e Naldinho, tornou-se o principal
sucesso da carreira de Marinalva.

No mesmo período, participou, com duas músicas, da coletânea Canjica, pamonha e rojão (1977), da qual também faziam parte Jackson do Pandeiro (como produtor e intérprete), Severo, Manezinho Silva, Alventino Cavalcanti e Haroldo Francisco (Kojak do Forró).

 

Duplo sentido e década de 80

O forró com letras de duplo sentido, popularizado na década de 70 por Genival Lacerda e seguido por artistas como Messias Holanda e Zenilton, tornou-se praticamente uma preferência nos anos 80 por parte das gravadoras, que lucravam bastante com a boa venda de discos que exploravam o tema. Sandro Becker, Zé Duarte e Clemilda, a partir da primeira metade da década, juntaram-se aos principais nomes do gênero gravando músicas apimentadas, mas antes do sucesso desses três Marinalva já começava a acrescentar em seu repertório o duplo sentido. O LP De rolha na boca (1980) trouxe a temática escancarada no próprio título, retirado da faixa homônima de autoria do cantor e compositor João Gonçalves, mestre no estilo, em parceria com Micena do Icó. Não se pode dizer, entretanto, que Marinalva tenha feito discos de duplo sentido, pois, apesar de quase todos os seus LPs seguintes possuírem músicas com letras do gênero, elas nunca chegaram a predominar no repertório – eram, no
máximo, duas ou três por disco.

Mesmo tendo gravado canções de sentido dúbio, Marinalva parecia não se sentir muito à vontade com a temática. Em 1991, ao saber que sua gravação de “Tarde nordestina” havia sido escolhida para integrar a coletânea Brazil Classics 3 – Forró etc., produzida principalmente para o mercado internacional pelo músico David Byrne, ex-líder da banda norte-americana Talking Heads, a cantora demonstrou alívio: “É muito bonita. Fala das coisas do Nordeste, do sofrimento dessa gente do sertão. Ainda bem que não foi daquelas indecentes, de duplo sentido”, declarou (Matéria “Forró a laser agita o mercado americano”. Jornal do Brasil, 15/06/1991). No encarte do CD, o texto assinado pelos professores, escritores e estudiosos de música Larry Crook e Charles A. Perrone destaca que Marinalva costumava fazer “canções tipicamente nostálgicas como Tarde Nordestina”. Moda na época, o duplo sentido acabou sendo responsável pelo maior sucesso de Marinalva naquele período: “Forró na Bica” (João Gonçalves/Marinalva), regravada em 1986 por Sandro Becker.

“Forró na bica” fazia parte do disco Um bom forró, que sucedeu Cheguei (último álbum com o ex-marido e sanfoneiro Zezinho, lançado em 1983), e que marcou uma mudança no som da forrozeira. A partir da parceria com seu marido Aracílio Araújo, houve uma “acelerada” em geral nas músicas, que ficaram mais dançantes, trazendo o álbum Um bom forró arranjos de sanfona mais ariscos, principalmente em faixas como “Um bom forró” (João Gonçalves/Marques Irmão), “Quero me divertir” (Aracílio/Marinalva/Calisto Moreira), “A noite é minha” (Aracílio/Marinalva) e “No cheiro de forró” (Aracílio/Marinalva) – esta última regravada por Flávio José em 1991. Foi o primeiro trabalho de Marinalva com Aracílio Araújo e também com Quartinha (zabumba), que permaneceu trabalhando com ela por vários anos. “Marinalva cantava muito. Muito, muito mesmo. Era um Luiz Gonzaga de saia. No palco ela ia pra lá, pra cá, como Elba Ramalho. Além de grande artista, era uma pessoa muito legal, era minha amiga e comadre”, comenta o zabumbeiro, destacando a energia da intérprete em suas apresentações.

Após Um bom forró, a paraibana lançou Enxugue o rato (1986), que trazia a versão cantada para a faixa-título de Luiz Moreno, com participação de Abdias. O disco foi gravado no Rio de Janeiro e contou com Marcos Farias, músico, produtor e maestro, filho de Marinês, na produção (junto com seu pai Abdias) e nos arranjos. Na sequência, veio o disco Marinalva e sua gente (1987), seu melhor e mais animado trabalho dessa fase (junto com Um bom forró). Seguindo o exemplo de nomes como Jorge
de Altinho e Nando Cordel, Marinalva e sua gente contou com a inserção de metais em faixas como a regravação de “Jacaré dos Homens” (Elino Julião) e o pot-pourri de abertura com “Saudade de Campina Grande” (Rosil Cavalcanti), “Não dá pé” (Cecéu) 3 e “É tempo de voltar” (Dominguinhos/Anastácia), músicas anteriormente gravadas por Marinês. Esse pot-pourri inclusive foi utilizado pela cantora na apresentação, em rede nacional, no programa Clube do Bolinha, da TV Bandeirantes. Marinalva e sua gente foi o último disco gravado na década pela artista, que também realizou trabalhos em álbuns de outros músicos, como no LP Merengue dela (1986) de Arlindo dos 8 Baixos, onde tocou triângulo e atuou como assistente de produção, e no LP Bom pra forrozar (1989), de Duda da Passira, cantando em uma faixa.

Foi também na década de 80 que Marinalva viu crescer sua popularidade no Nordeste. Era convidada frequentemente para programas locais de televisão, em canais como a TV Tupi de Recife, a TV Jornal do Commercio (Rede Bandeirantes) e TV Universitária. A agenda de shows também era cheia, com apresentações em diversas cidades nordestinas, sendo anunciada como uma das maiores atrações de grandes festividades. Os anúncios e notícias abaixo comprovam que Marinalva era uma das mais principais cantoras nordestinas do período:


Anúncio do ano de 1989 (Diário de Pernambuco).


Anúncio do ano de 1983 (Diário de Pernambuco).


Notícia de 28/06/1983 e 24/05/1989 (Diário de Pernambuco).


Notícia de 24/05/1989 (Diário de Pernambuco).

 

Final da carreira

1990 foi o ano de lançamento do LP Pra lá de bom, lançado pela Polydisc, com praticamente todas as músicas assinadas por Aracílio Araújo (com parcerias), além de “Pescador Potoqueiro” (João Silva/Messias Holanda) e “Os pernilongos” (João Gonçalves/Marinalva), ambas de duplo sentido. No ano seguinte participou do LP Daquele jeito, do cantor Agamenon Show, cantando em uma das faixas. Em 1992 veio Coração teimoso, último disco da cantora, que trouxe as versões de “Resto de amor” (Cecéu) e “A separação” (Jorge de Altinho/Feliz Barros/Gisa Rocha), sucessos com o Trio Nordestino, além da regravação de “Tarde Nordestina” (D. Matias/Naldinho). Com arranjos do acordeonista Severo, o disco mostra a cantora em plena forma, principalmente em “Coração teimoso” (João Silva), comprovando que seu talento poderia proporcionar ainda, por muitos anos, outras grandes interpretações.

As apresentações musicais de Marinalva, que àquela época normalmente contavam também com seu marido Aracílio Araújo (triângulo), Quartinha (zabumba) e Cicinho (sanfona), duraram até por volta de 1993, quando a cantora começou a enfrentar problemas de saúde. Diabética, chegou a perder parte de um dos pés, dificultando sua locomoção, especialmente em viagens. “A gente fazia muitos shows em Pernambuco e também na Bahia. Por questões de saúde, ficou difícil pra ela continuar”,
relembra Aracílio. A partir daí, Marinalva passou a se dedicar apenas ao lar, atuando esporadicamente em gravações de outros artistas, como no coro de discos de Aracílio Araújo e Santanna (ainda se apresentando como Luís de Santana), e no dueto com Ivan Ferraz em “Mané e Zabé” (Zé Dantas/Luiz Gonzaga), música que marcou a carreira de Marinês por ter sido sua primeira gravação, em 1956, cantando com Luiz Gonzaga. Em 1998 Marinalva ainda participou da décima edição do festival Forró Fest, organizado anualmente pelas TVs Cabo Branco (João Pessoa) e Paraíba (Campina Grande). Na ocasião, interpretou a canção “Mulher forrozeira”, de Aracílio Araújo, ficando com o 3ª lugar no concurso. “Ela recebeu uma sanfona avaliada em dez mil reais como prêmio”, recorda-se, com orgulho, o compositor. A música, assim como as demais finalistas, ganhou versão de estúdio, registrada no CD Forró Fest 10 anos.

Nos anos 2000, Marinalva continuou sofrendo com problemas de saúde em consequência da diabetes e praticamente não atuou artisticamente. Em 11/09/2004, por complicações decorrentes de um AVC sofrido poucos dias antes, faleceu, aos 56 anos, na cidade de Recife/PE.

 

Vida familiar

Não foi somente junto aos seus irmãos que Marinalva teve influência artística. Nos seus casamentos, a paraibana sempre se relacionou com pessoas ligadas à arte. Ainda muito jovem, em uma de suas apresentações Marinalva conheceu o artista circense Arlindo Fernandes, com quem teve seu primeiro filho, Ricardo, nascido em 1965. Pouco tempo depois, separou-se de Arlindo e passou a viver com o sanfoneiro conhecido como Gonzaguinha (que inclusive gravava com ela e tocava nos shows), com quem permaneceu cerca de cinco anos e teve o filho Ronaldo, em 1971. Logo após o nascimento de Ronaldo, no entanto, a união com Gonzaguinha foi desfeita, tanto que o garoto foi criado e registrado pelo marido seguinte de sua mãe, Zezinho (José Bernardo Filho), também acordeonista e que permaneceu com Marinalva até por volta de 1983. Zezinho também atuava artisticamente com ela nas apresentações e em vários discos – o último foi Cheguei. Com ele, a forrozeira teve duas filhas, Jussara (1978) e Janaína Maria (adotiva). Já separado de Marinalva, Zezinho, também conhecido como Zezinho do Acordeon ou Zezinho da Paraíba, destacou-se nos anos 90 na banda Mastruz com Leite, tocando por vários anos no famoso grupo. Desde aquela década radicou-se em Fortaleza/CE, onde também gravou alguns CDs em carreira solo.

Após a separação com Zezinho, Marinalva teve como marido o cantor e compositor Aracílio Araújo, com quem foi casada até o final de sua vida. Aracílio, que possui 8 CDs gravados, teve várias composições interpretadas também por diversos outros artistas, como Alceu Valença, Elba Ramalho, Fagner, Marinês, Adelmário Coelho e Flávio José. É dele a canção “Deixe o rio desaguar” (também gravada por Félix Porfírio e Flávio José, entre outros), que se tornou uma espécie de hino da transposição do rio São Francisco. Foi fundamental na carreira da esposa, atuando nos discos (desde Um bom forró até Coração teimoso) e compondo diversas canções que fizeram parte do repertório dela. O casal teve os filhos Marcílio (1985) e Marcelino (por adoção). Marcílio (zabumba e vocal) e seu irmão Ronaldo (sanfona), aliás, seguiram os passos dos pais e são músicos em Olinda, onde atuam há mais de 10 anos na banda Forró sem Fronteiras. Em relação às cidades onde residiu, Marinalva, além de Campina
Grande/PB, morou em João Pessoa/PB e também, por curtos períodos, no Rio de Janeiro/RJ, Salvador/BA e Aracaju/SE. Nos anos 80 mudou-se definitivamente para Olinda/PE, sua última cidade.

 

Discografia

Para a pesquisa sobre a discografia de Marinalva, foram consultados diversos sites de música (principalmente o Forró em Vinil) e de comércio de discos, bem como jornais e acervos de colecionadores, sendo encontrados 11 LPs solo e 11 participações em coletâneas (6 delas com músicas inéditas e outras 5 com fonogramas extraídos de discos anteriores). O total de gravações, incluindo duetos em discos de outros artistas, foi de 140. Dessas, assinou como compositora, com parcerias, em 25. Teve também uma composição gravada por Arlindo dos 8 Baixos (mas não gravada por ela), totalizando 26 composições, várias delas com o marido Aracílio Araújo, que explicou que, na verdade, o processo de criação não passava pela esposa: ele fazia a canção sozinho e registrava o nome dela como co-autora. Todos esses números, entretanto, podem ser maiores, tendo em vista a escassez de fontes disponíveis para consulta.

Dos discos individuais relacionados abaixo, somente o Pra lá de bom, atualmente, não está disponível para audição nas plataformas digitais de streaming. Todos os demais, bem como algumas coletâneas, podem ser encontrados:

Discos solo
Eu também sou de lá (1970, Maraca)
Poeira do caminho (1974, CBS/Tropicana)
Viva o Nordeste (1977, Chantecler/Alvorada)
Tardes nordestinas (1978, Chantecler/Alvorada)
De rolha na boca (1980, Rozenblit)
Cheguei (1983, Rozenblit)
Um bom forró (Palco) (Não foram encontrados registros, provavelmente foi lançado em 1985)
Enxugue o rato (1986, Polygram/Memória)
Marinalva e sua gente (1987, Polydisc)
Pra lá de bom (1990, Polydisc)
Coração teimoso (1992, Somarj)

Coletâneas
O fino da roça vol. 3 (1971, Fontana)
Quermesse (1971, Fontana)
O fino da roça vol. 4 (1972, Fontana)
Quermesse vol. 2 (1972, Fontana)*
Fogo na geringonça vol. 2 (1972, Fontana)
Forró (1976, Phonogram/Polyfar)*
Canjica, pamonha, rojão (1977, Chantecler/Alvorada)
O fino do fino da roça (1979, Polygram/Sinter)*
O fino do fino da roça vol. 2 (1980, Polygram/Sinter)*
Puxando fogo (1985, Polygram/Sinter)*
Forró fest 10 anos (1998)
* Discos sem canções inéditas de Marinalva.

 

A falta de reconhecimento

Ótimos discos, mais de 20 anos de carreira, participação em várias coletâneas e uma boa popularidade no Nordeste no período em que atuou. Isso tudo, porém, não foi suficiente para que o nome de Marinalva se tornasse conhecido nacionalmente. Mesmo quem não conhece muito bem a música nordestina certamente sabe quem é Marinês, mas, provavelmente, nunca ouviu falar em Marinalva. Alguns motivos podem explicar o fato. Primeiramente, ela surgiu artisticamente em um período em que o forró, ofuscado por gêneros diversos, era pouco valorizado fora da região nordestina. Segundo, porque lhe faltou uma melhor estrutura de apoio na carreira, um empresário ou gravadoras que investissem mais no seu talento.

“Marinalva cantava muito bem. Tinha uma voz linda, afinada, mas não tinha uma boa estrutura em volta dela. Não tinha o tirocínio artístico da irmã, por exemplo. Era um pouco desorganizada. Somente nos anos 80 é que as coisas se ajeitaram mais”, opina Aracílio Araújo, viúvo da cantora, a respeito do assunto. Além desses fatores, faltou também a Marinalva uma música que estourasse nas rádios de todo o país, como aconteceu com “Severina Xique-Xique” (João Gonçalves/Genival Lacerda) e “Prenda o Tadeu” (Antônio Sima/Clemilda), sucessos com Genival Lacerda e Clemilda, respectivamente. Essa lacuna pode ser explicada pela falta de um empenho maior por parte das gravadoras junto à mídia ou mesmo por não ter tido uma maior sorte. O jornalista e escritor Luís Antônio Giron, em texto publicado em 1991 na Folha de São Paulo sobre o já mencionado CD Brazil Classics 3 – Forró etc. (Matéria “David Byrne acha que o forró é uma mistura de ska com polca”, Folha de São Paulo, 19/06/1991), ao mesmo tempo em que elogia a cantora por sua interpretação de “Tarde nordestina”, sugere que a falta de sucesso da paraibana no sul se devia a sua “estigmatização pela baixa qualidade de seu repertório”, comparando-a a Clemilda. Certamente se referia às composições de duplo sentido, demonstrando desconhecer o trabalho em geral de Marinalva, já que menos de 10% das canções gravadas por ela tinham letras maliciosas. A respeito de ter sido irmã de uma cantora já famosa, claro que o fato já lhe servia como um bom cartão de visitas, mas, no geral, o parentesco não foi fundamental em sua carreira. “Marinalva não gostava de explorar o fato de ser irmã de Marinês, não ficava usando isso para se promover, tinha uma carreira independente. Pode escutar todos os discos de Marinês. Você não vai encontrar sequer uma participação de Marinalva”, explica Aracílio Araújo.

Todos esses aspectos abordados, no entanto, não justificam o esquecimento sobre a cantora no Nordeste, principalmente em Pernambuco, onde ela desenvolveu boa parte da carreira, e em sua terra natal. A Paraíba, berço de grandes nomes do forró como Jackson do Pandeiro e Sivuca, normalmente reconhece a importância de seus valores artísticos, mas praticamente não se fala, não se escreve e não se toca Marinalva. Até mesmo em Campina Grande seu nome é pouco citado. O Forró Fest e o Troféu Gonzagão, eventos sobre a música nordestina realizados anualmente no estado e que já homenagearam inúmeros paraibanos, nunca lembraram de Marinalva. Logicamente, pelo que representou, é normal que Marinês, um dos grandes pilares da história do forró, seja bem mais mencionada, mas Marinalva também merece ter seu destaque. Nunca é tarde para a arte, para que as novas gerações (re)descubram valores do passado. E, quem sabe, essa redenção não se inicie pela Paraíba – e sua gente?

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Entrevista: Neuza Flores dos Anjos, por Érico Sátiro

Entrevista com Neuza Flores dos Anjos feita pelo Érico Sátiro para a revista Genius, edição 38;

29 de maio de 1967. Foi nessa data que a vida da baiana Neuza Flores dos Anjos mudou radicalmente. Nascida em 11 de agosto de 1942 na pequena Itororó, cidade localizada no sul da Bahia, de onde não tem lembranças, Neuza mudou-se ainda pequena com sua família para o interior de São Paulo, onde seus pais, Seu Laurindo e Dona Adélia, tentariam uma vida melhor. Sexta de um total de sete filhos (quatro mulheres e três homens), ela se recorda das dificuldades enfrentadas pela família àquela época: “Era duro, eu era de uma família muito humilde. Meu pai foi trabalhar na lavoura em troca, praticamente, de comida para a gente. Era uma época muito difícil.” Após um tempo, uma de suas irmãs foi trabalhar em São Paulo (capital) e aos poucos foi levando, um a um, os irmãos e os pais. Na capital, todos começaram a trabalhar para ajudar no sustento da família. “Até eu, com 14 anos, comecei a trabalhar em uma firma. Somente minha mãe ficava em casa cuidando das coisas. A vida deu uma melhorada”, conta Neuza. E assim ela foi se virando, trabalhando em vários empregos, até o dia 29 de maio de 1967, quando ela foi embora para o Rio de Janeiro para viver ao lado de Jackson do Pandeiro, seu marido até 1982, quando o Rei do Ritmo faleceu.

Em uma manhã chuvosa de sábado, em seu simpático apartamento de 3 quartos no bairro Jardim Cidade Universitária, em João Pessoa/PB, onde reside com José Clementino Feitosa, conhecido como Zezé, seu companheiro há 10 anos, Neuza Flores, com a simpatia e carisma que lhe são característicos, concedeu essa entrevista exclusiva para a Revista GENIUS.

GENIUS – Antes de conhecer Jackson do Pandeiro pessoalmente, você já era uma fã dele? Já gostava do forró?

Neuza – Quando eu morava no interior de São Paulo, eu não conhecia forró, pois lá se tocava mais música sertaneja, mas quando fui para a capital e ouvi Jackson do Pandeiro, eu me apaixonei pela voz dele, nem conhecia a pessoa. Era uma voz muito diferente, aqueles graves dele, aquilo me encantou demais.

GENIUS – E como vocês se conheceram?

Neuza – Jackson do Pandeiro foi a São Paulo fazer uma de suas últimas apresentações com Almira Castilho, de quem estava se separando – e disso eu não sabia. Era no forró de Pedro Sertanejo1, em um domingo à noite, e eu nem gostava de sair aos domingos, pois teria que trabalhar cedo na segunda-feira, mas mesmo assim combinei de ir com uma amiga. Chegando lá, na parte superior, onde funcionava um bar, encontrei Jackson e Almira em uma mesa, sentados, tomando um conhaque – lembro como se fosse hoje. Eu queria tanto conhecê-los que fui lá e me apresentei: “Meu nome é Neuza Flores, sou uma fã e vim aqui só pra conhecer vocês”. Jackson me deu um abraço, eu apertei a mão de Almira, abracei-a também, e ele ainda me convidou para tomar uma bebida. Agradeci, pedi licença e fui sentar em outra mesa com minha amiga. Após o término do show, olhei no relógio, fiquei preocupada com a hora e já estava indo embora quando apareceu Ary Lobo, também cantor de forró, dizendo que Jackson estava me chamando. Eu estranhei e perguntei para Ary Lobo: “E Almira? Almira não é a esposa dele?”. Ele apenas me respondeu que Jackson do Pandeiro estava ali me esperando. Então eu fui ao encontro de Jackson, que logo me convidou para jantar, mas eu expliquei que não poderia porque teria que trabalhar cedo e também porque meus pais estavam me esperando, pois não tinha costume de chegar tarde em casa. Além disso, eu perguntei: “E você não é casado? Cadê Almira?”. Ele me respondeu: “Morena, você não lê jornal não?”. Eu disse: “Seu Jackson, você já viu quem trabalha em uma metalúrgica ter tempo para ler jornal?”. Pois bem, ele me explicou que tinha se separado de Almira2 e me convenceu a jantar e deixar minha preocupação com o emprego de lado. Fomos a um restaurante próximo e ficamos lá, ele tomando aguardente, tocando violão, e nisso o tempo foi passando. Quando já era perto de umas quatro da manhã, falei que precisava pegar um ônibus para ir embora e ele se ofereceu para me deixar em casa. Chegando lá, meus pais já estavam preocupados, mas nós descemos, eu apresentei Jackson a eles, que também eram fãs, e minha mãe foi logo se encantando, fazendo café, mandando comprar pão, aquela puxação de saco, né? E Jackson ali, gostando. Ficamos a manhã toda e, após o almoço, Jackson pediu aos meus pais autorização para eu ir embora com ele para o Rio de Janeiro. Minha mãe respondeu: “Se for para o bem dela, que Deus abençoe vocês”. Meu pai disse a mesma coisa. Mas eu perguntei a Jackson: “E eu? Você não perguntou a mim. Eu tenho meu emprego, não posso ir”. Mais uma vez ele me convenceu a parar de pensar no meu emprego, dizendo que no trabalho é assim, de uma hora pra outra eles mandam embora. Eu realmente pensei: “Minha vida não é muito boa aqui, não custa tentar”. Aí fui embora com ele, no mesmo dia. Foi em 29 de maio de 1967, eu tinha 24 anos. Isso não me sai da memória. E vivemos felizes, sabe?

GENIUS – E chegando ao Rio, como foi o início lá?

Neuza – Quando chegamos, como Jackson dividia a casa com a irmã dele, Severina, falou pra ela que eu era uma pessoa que ele tinha levado pra ajudá-la na casa – risos. “Jackson, conta essa estória direito…”, Severina disse. Isso chegou nos ouvidos de Almira rapidinho, que entendeu tudo: “Que nada, ele não levou pra ajudar ninguém não. É mulher que ele levou pra ele mesmo!”, teria dito. Almira era esperta, ela entendeu logo, mas também ficou com aquela ciumeira, porque eu era novinha, bonitinha. Depois Jackson contou toda a verdade e disse que inventou aquilo apenas porque ainda estava em processo de separação com Almira.

GENIUS – Quando vocês começaram a se relacionar, ele já não estava mais no auge da popularidade. Era realmente uma fase ruim na carreira?

Neuza – Eu peguei um tempo ruim e uma parte boa. Houve uma fase dura mesmo, em que as músicas sumiram, alguns artistas nordestinos tiveram até que vender seus instrumentos para sobreviver. Jackson ainda aparecia em programas de tv, ia a forrós, viagens de vez em quando, mas era mais escasso, era mais difícil, já não era como antes. A parte boa retornou nos anos 70, na época em que Gilberto Gil gravou “Chiclete com Banana”3. A partir daí o negócio deu uma clareada, aquela música levantou. Mas na verdade pra mim sempre foi tudo bom, eu estava ao lado dele nas horas ruins e boas, isso que é o importante, né não?

GENIUS – Você chegou a se apresentar nos shows com Jackson do Pandeiro, tocar, fazer parte do coro, compor. Como foi que ele lhe iniciou na música?

Neuza – Demorou um pouco porque eu não tinha prática, não era do meio. Mas ele foi me lapidando em casa, ensaiando. Quando viu que eu estava afinadinha, chegando onde ele queria, ele me colocou para participar do coro. Foi no início dos anos 70. Eu participei das gravações e das apresentações. Acho que uma das primeiras foi no programa da TV Cultura4.

GENIUS – E os instrumentos? Você chegou a tocar agogô, não foi?

Neuza – Foi, toquei somente agogô, mas foi uma história interessante. Quando nós acompanhamos Alceu Valença em um festival, durante os ensaios, em casa, Alceu sugeriu a Jackson para que eu tocasse um instrumento. Eu era péssima em instrumentos, mas Alceu disse pra eu tocar agogô porque era mais fácil. Foi aí que eu fui me desinibindo mais.

GENIUS – Certa vez Jackson lhe elogiou publicamente, em uma matéria jornalística5, falando bem de sua voz e afirmando que você era melhor que Almira em dueto…

Neuza – Eu tinha a voz muito afinada. Ele ficou admirado na primeira vez que eu fui fazer coro com ele em casa. Ele estava cantando uma música e eu entrei para fazer dueto, ele ficou admirado com o que ouviu. Pra quem não cantava, né? Ele me elogiava em tudo, dizia que eu era tudo na vida dele.

GENIUS – Você tem 3 músicas compostas sob o pseudônimo de Mascotte, duas delas gravadas por Jackson. De onde surgiu esse nome?

Neuza – Risos. Esse Mascotte foi Jackson mesmo que colocou. Ele não queria colocar Neuza, então, como no conjunto só tinha homens, disse que eu era a mascotinha. Aí colocou Mascotte.

GENIUS – E como foi sua participação nessas composições?

Neuza – A primeira foi “Dá licença”6. Jackson gostava muito de candomblé, e essa era uma música de terreiro que minha mãe cantava. Então eu cantarolava em casa: “Dá licença aí, dá licença aí…”. Pausa – Neuza se emociona ao lembrar de sua mãe e Jackson. Ele começou a escutar, prestou bem atenção, pegou o violão e começou a tirar o tom. Eu não sabia a letra toda, mas ele começou a pesquisar os nomes – Jackson tinha um dicionário de candomblé – mudou umas coisas e completou a letra. “Xodó no forró”7 foi uma música que Durval Vieira8 fez e levou pra Jackson gravar. Durval ia lá em casa ensaiar, mostrar músicas. Um dia ele levou essa, meu marido gostou e Durval ofereceu a parceria, registrando o nome de Mascotte. Já “Forrofofó”9 foi minha autoria sim. Eu queria fazer um forró e estava em casa sozinha, então comecei a cantar. De repente chegou a compositora Italúcia e começou a me ajudar: “Coloca essa palavra, aqui, troca essa ali…”. O título e a melodia foram eu que fiz. Marinalva10, que também frequentava muito nossa casa, ouviu a música e me pediu para gravar.

GENIUS – E “Chegou a hora da fogueira”11, que você gravou solo?

Neuza – De Lamartine Babo, né? Foi a única que eu cantei sozinha. Jackson quis me meter nessa gravação. Saiu direitinho, mas eu fiquei muito nervosa, com um medo danado de errar. O instrumental foi do Conjunto Borborema12. Depois não surgiram outras oportunidades.

GENIUS – Com quem Jackson tinha mais amizade no meio artístico, na época em que você viveu com ele?

Neuza – Olha, Jackson era muito querido no meio artístico, praticamente todos gostavam dele. Quase não tinha inimigos, apenas não se dava muito com Jorge Veiga13, eram como gato e rato. Já Luiz Gonzaga ele nem gostava nem desgostava. Mas Clara Nunes ia lá em casa, Baby Consuelo ia também. Ele também tinha amizade com Raul Seixas, todo mundo gostava de Jackson, era muito humilde. Também ajudou muita gente, como Zé Calixto, Antônio Barros, Genival Lacerda, Bezerra da Silva. Nós que gravamos o primeiro disco de Bezerra da Silva14.

GENIUS – O que Jackson mais gostava de escutar em casa?

Neuza – Ele escutava praticamente apenas forró, cantava umas coisas de Luiz Gonzaga, mas até Jorge Veiga ele adorava ouvir também. Aquelas músicas românticas de Orlando Silva ele gostava, cantava com o violão, Jackson era um pouco romântico também, viu? Só que pra cantar, ele gostava mesmo era do forró.

GENIUS – E aquela fase em que vocês participaram do Universo em Desencanto15, como foi?

Neuza – Foi em uma época que o compositor Sebastião Batista era de lá e nos convidou para conhecer. Ele chegou pra Jackson e falou: “Jackson, eu conheci um ensinamento muito bom e gostaria que você também fosse conhecer, é em Belfort Roxo”. Lá, Jackson conheceu o fundador, Manoel Jacinto, e começou a frequentar e se aperfeiçoar. Daqui a pouco apareceram artistas como Tim Maia, Procópio Ferreira, Lady Francisco, de quem peguei grande amizade, e outros. Íamos semanalmente lá, saíamos à rua, todos de branco, com aquele emblema do Universo em Desencanto. Nós lemos o livro, cada um tinha o seu. Ficamos uns quatro a cinco anos, aproximadamente, frequentando.

GENIUS – O que os fez abandonar essa filosofia?

Neuza – Como em todas as religiões, sempre tem umas coisinhas que a gente vai desgostando. Acho que Jackson viu alguma coisa que não gostou e começou a se afastar aos poucos. Se teve algum motivo específico, eu não me lembro. Jackson também não falou.

GENIUS – E o dia a dia de Jackson do Pandeiro? Quais eram as atividades?

Neuza – O hobby dele era ficar em casa tocando seu violãozinho, sentado em um tamborete. Também adorava ficar desmontando e refazendo os pandeiros. Tirava os guizos, as tarraxas e encourava o pandeiro de novo. Às vezes, quando Cícero16 comprava um zabumba, levava direto pra ele ouvir: “Nego véi, não gostei desse som, vamos comprar outro couro pra esse zabumba”, dizia Jackson para o irmão. Comprava a pele e refazia o zabumba. Era desse tipo de coisa que ele gostava. Não era muito de sair, era caseiro.

GENIUS – Jackson faleceu muito cedo, com 62 anos, quando já tinha alguns problemas de saúde. Ele não costumava se cuidar?

Neuza – Ele tinha diabetes, pressão alta e fumava muito, não costumava se cuidar não. Como gostava muito de música, acabava deixando a saúde em segundo plano. Quem cuidava da diabetes dele era eu. Na última viagem que ele fez, eu não fui e a coisa engrossou. Ele, por exemplo, gostava muito de café e quando parava nos locais para tomar, eu tinha que ir na cozinha pedir para não colocarem açúcar. Se eu não estivesse, ele tomava com açúcar mesmo, do jeito dele.

GENIUS – Depois do falecimento dele, como ficou sua vida?

Neuza – Mudou tudo de novo, pra pior. Eu era dependente dele e passei a não ter aquela ajuda que eu tinha, nem apoio. Passei por um baque desse e não tive apoio, fiquei sem chão. Voltei pra São Paulo sem nada, minha irmã foi me buscar, não tive ânimo pra trabalhar, mas tinha que me virar. De 1982 a 2005 eu fiquei em São Paulo sempre com uma ocupação, trabalhando em firmas, com o que aparecia. Quando eu trabalhava nas firmas, as coisas não eram tão ruins, mas quando eu passei a trabalhar de diarista a situação piorou, porque não tinha nada fixo. Eu cheguei a perder a vontade de viver. Pausa – emociona-se novamente. Depois minha cunhada me ajudou e me chamou para morar com ela e sair daquela situação.Morei também com minha irmã. Fui arrumando uns trabalhos e assim fui vivendo, até que Fernando Moura17 me achou em Mauá e passou a se comunicar comigo sobre o livro que estava escrevendo. Consegui me aposentar e depois recebi a notícia de que o Governo da Paraíba poderia me conceder uma pensão vitalícia, desde que eu passasse a residir aqui. Eu não tinha nem dinheiro pra passagem, mas deram um jeito e foram me buscar. A partir daí as coisas melhoraram, peguei amizade com muita gente em João Pessoa, estou aqui há 14 anos. Fernando Moura me ajudou bastante também. Hoje estou feliz.

GENIUS – Você acha, atualmente, que Jackson do Pandeiro tem o seu verdadeiro valor reconhecido? Quais as expectativas para o centenário?

Neuza – Eu acho que é reconhecido sim, mas esse reconhecimento foi muito tardio, no meu entender deveria ter sido há muito tempo. Mas, como se diz, está de bom tamanho. Quanto ao centenário, pelo que vi, ele está sendo muito homenageado e espero que continue assim. Estou achando bom.

1Pedro Sertanejo, sanfoneiro, compositor e radialista baiano, falecido em 1997, foi um dos pioneiros na difusão do forró em São Paulo, com sua casa de shows. Fundou o selo Cantagalo e era pai do consagrado músico Oswaldinho do Acordeon.

2Mesmo após o início do processo de separação, Jackson e Almira ainda atuaram juntos algumas vezes. Jackson teve 3 uniões em sua vida: uma rápida e turbulenta com Maria da Penha Filgueiras, em 1938, ainda em Campina Grande; com Almira Castilho, de 1954 até o início de 1967, e Neuza Flores, de 1967 a 1982.

3“Chiclete com Banana” (Gordurinha/Almira Castilho), sucesso gravado por Jackson do Pandeiro em 1959, foi regravada por Gilberto Gil em 1972 no LP “Expresso 2222”.

4Programa MPB Especial, dirigido por Fernando Faro, gravado em 1972 pela TV Cultura. Em 2012, o vídeo do programa com Jackson do Pandeiro, composto de entrevista e apresentações musicais, foi lançado em dvd pelo selo Discobertas.

5Jornal Diário de Notícias, Rio de Janeiro/RJ, 1973, edição 15536.

6“Dá licença” (Jackson do Pandeiro/Mascotte) foi lançada por Jackson do Pandeiro em 1978, no LP “Alegria minha gente”.

7“Xodó no forró” (Durval Vieira/Mascotte), música em homenagem a Dominguinhos, foi lançada por Jackson em 1978, no LP “Alegria minha gente”.

8Cantor e compositor alagoano, falecido em 2014, foi o autor de centenas de músicas do forró, principalmente de duplo sentido, gravadas por nomes como Genival Lacerda, Clemilda, Sandro Becker e outros. Um dos seus maiores sucessos foi “Tem pouca diferença”, gravada por Jackson do Pandeiro em 1981 e regravada por Gal Costa, com participação de Luiz Gonzaga, em 1984.

9“Forrofofó” (Italúcia/Mascotte) foi gravada por Marinalva no LP “Tardes Nordestinas”, de 1978.

10Cantora e compositora paraibana, era irmã da famosa “rainha do xaxado” Marinês. Gravou dezenas de Lps de forró, falecendo em 2004.

11“Chegou a hora da fogueira” (Lamartine Babo) foi gravada por Neuza Flores em 1976. no LP “Mutirão”.

12O Conjunto Borborema acompanhava Jackson do Pandeiro em suas gravações e apresentações, tendo como base os músicos Cícero (zabumba) e Tinda (triângulo), irmãos de Jackson, e Severo (acordeon), além de outros que fizeram parte de sua formação ao longo dos anos, como o paraibano Manoel Serafim (pandeiro).

13Sambista carioca, falecido em 1979, conhecido como “caricaturista do samba”, foi uma das influências musicais de Jackson do Pandeiro.

14LP “O Rei do Coco”, lançado em 1975 por Bezerra da Silva, teve como diretor musical Jackson do Pandeiro.

15Espécie de doutrina ou filosofia, também conhecida como Cultura Racional, criada por Manoel Jacinto Coelho, que pregava conhecimentos ditados por um ser extraterreno, o “Racional Superior”.

16Geraldo Gomes, mais conhecido como Cícero, era o irmão mais novo de Jackson do Pandeiro. Acompanhava o irmão tocando zabumba no Conjunto Borborema.

17Jornalista e escritor, autor da biografia “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, em parceria com Antônio Vicente, lançada em 2001.

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Fatos e curiosidades sobre a vida e obra de Jackson do Pandeiro – Texto de Érico Sátiro

Fatos e curiosidades sobre a vida e obra de Jackson do Pandeiro

Texto de Érico Sátiro

 

Abraço de tamanduá

Na noite de 16 de janeiro de 1960, Jackson do Pandeiro faria um show, juntamente com Almira Castilho, no Texas Bar, no Rio de Janeiro. Antes da apresentação, foram jantar em um restaurante na av. Rio Branco, onde tudo corria tranquilo até que, ao levantar-se para ir embora, Jackson foi abordado por dois fãs que o cumprimentaram de maneira tão efusiva, que um deles começou a abraçar o artista e levantá-lo várias vezes, apertadanebte. Resultado: uma costela quebrada, show no Texas Bar suspenso e a perda do cachê de 10.000 cruzeiros pelo cancelamento da apresentação. Apesar do incidente, Jackson posou para fotos com seu habitual bom humor, usando um cartaz que dizia: “Cuidado! Não me abrace. Estou com uma costela quebrada de abraços de um fan”.


Foto: Radiolândia, 1960, edição 307.

 

Tri adiado

Quando a seleção brasileira de futebol conquistou seu terceiro título mundial em 1970, no México, a gravadora Continental lançou um compacto simples contendo a canção “Frevo do Tri” (Braz Marques/Álvaro Castilho), interpretada por Jackson do Pandeiro, para enaltecer a espetacular proeza do time canarinho, além da música “O caneco é nosso”, cantada pelo Coral 70. Esse compacto, ainda hoje, é facilmente encontrado à venda em sites da internet e era considerado, até pouco tempo, o disco de lançamento do “Frevo do Tri”.
Ocorre que Jackson foi artista da Continental apenas no ano de 1966, estando, em 1970, na gravadora Philips. O fato de sair uma música inédita do Rei do Ritmo pela Continental, em 1970, causava uma certa estranheza. Duas evidências encontradas pelos pesquisadores, então, clarearam melhor a questão. A primeira veio de uma matéria do Jornal do Brasil, de 1966, que informava o prejuízo do mercado fonográfico nacional com a precoce eliminação da seleção brasileira na Copa do Mundo daquele ano, a exemplo da gravadora Continental, que já havia preparado o lançamento do “Frevo do Tri”. A mais importante, entretanto, veio através da “descoberta”, por parte do pesquisador Jocelino Tomaz de Lima, de uma música perdida de Jackson: “Garota de Botafogo” (Álvaro Castilho/De Castro). O compacto dessa canção também é da Continental e contém, no lado A, justamente o “Frevo do Tri”. Embora o selo não traga o ano da gravação, tudo leva a crer (formato do selo, nº do disco etc.) que esse compacto, além de ter sido gravado em 1966, também foi lançado nesse mesmo ano.
Dessa forma, é certo que o “Frevo do Tri” foi criado para enaltecer uma eventual conquista brasileira na Copa da Inglaterra (tentando repetir o sucesso do “Frevo do Bi”, de Braz Marques/Diógenes Bezerra, gravada por Jackson em 1962), sendo gravado e muito provavelmente lançado pela Continental em 1966, e relançado em 1970, aproveitando que a letra não mencionava nomes de atletas, local ou data. O único trecho da composição que ficou extemporâneo foi a citação de “80 milhões”, em referência à população brasileira, já que, em 1970, o censo demográfico nacional apresentava números superiores a 90 milhões. A dúvida que permanece é em relação ao motivo de o compacto “Frevo do Tri”/”Garota de Botafogo” ter se tornado tão raro. Ou o disco teve um grande fracasso de vendas, por conta de ter sido distribuído após a eliminação do Brasil no torneio, ou então foi produzido e teve sua comercialização cancelada, ficando as unidades fabricadas nas mãos de poucos fãs.

 

Censurado!

Também em 66, com repertório bastante diversificado, Jackson gravou “O cabra da peste”, um dos melhores discos de sua carreira, trazendo canções magníficas como “Capoeira mata um” (Álvaro Castilho/De Castro), “A ordem é samba” (Jackson do Pandeiro/Severino Ramos) e “Forró quentinho” (Almira Castilho), apesar do período de ostracismo pelo qual vivia o Rei do Ritmo e o próprio gênero do forró. “Polícia feminina” (Severino Ramos/José Pereira), uma das faixas do álbum, porém, acabou sendo alvo da censura proporcionada pelo regime militar, que determinou sua retirada do disco a partir da segunda tiragem.

 

LP “O cabra da peste”

 

A perseguição da censura aos artistas nordestinos do forró, que não costumavam gravar canções de protesto, tornou-se mais comum nos anos 70, com a explosão das músicas de duplo sentido. Não era o caso, entretanto, de “Polícia Feminina”, censurada por pura bobagem. Confiram a letra da canção e tirem suas conclusões:

Saí do cinema
De braço com Rosalina
Quando ouvi um “siu”
Era uma polícia feminina
Pediu meus documentos
Perguntou onde eu morava
Se era solteiro ou casado
E onde eu trabalhava
Mandou a garota embora
E eu fiquei detido
Eu fiquei desconfiado e muito constrangido
Falou que era dona daquela jurisdição
E eu continuava preso no seu coração
Só depois de meia-noite veio me libertar
Porque a fiscal da turma tinha que passar
Gostei do bate papo, qualquer dia eu vou voltar
Porque marcamos um encontro lá em Paquetá

 

Jackson no cinema

Entre os anos de 1956 a 1962, período em que gozou de grande popularidade, Jackson do Pandeiro participou de diversas produções cinematográficas, apresentando, em sua grande maioria, números musicais. O único filme em que integrou o elenco como ator foi a comédia “Minha sogra é da polícia”, de 1958, onde interpretou o cômico personagem Biriba, atuando ao lado de nomes como Violeta Ferraz, Wilza Carla e Costinha. Nas demais produções Jackson apresentava quadros musicais, participando também de um documentário sobre a noite do Rio de Janeiro. Abaixo, a relação de filmes e canções apresentadas pelo cantor paraibano em cada um:

1956 – “Tira a mão daí” – música “No quebradinho” (Marçal Araújo/José dos Prazeres);
1958 – “Minha sogra é da polícia” – Jackson do Pandeiro interpreta o personagem Biriba;
1958 – “O batedor de carteiras” – música “Querer e não poder” (Aparecida, Jackson e Jorge de Castro);
1959 – “Cala a boca Etelvina” – número músical intitulado “Fantasia Nordestina”, onde Jackson canta a música “Baião” (Luiz Gonzaga/Humberto Teixeira);
1959 – “Aí vem a alegria” – canção “Vou buscar Maria” (Jackson/Severino Ramos);
1960 – “Pequeno por fora” – canção “De araraê” ((Jackson/José Batista);
1961 – “O viúvo alegre” – música “Minha marcação” (Jackson/Alventino Cavalcanti/Uzias Silva);
1962 – “O bom mesmo é carnaval” – música “Vou ter um troço” (Arnô Provenzano/Jackson/Otolino Lopes);
1962 – “Rio à noite – A capital do samba” – documentário sobre a vida noturna carioca.

 


Cartaz do filme “Minha sogra é da polícia”

 

Além dos filmes já citados, Jackson do Pandeiro também participou da trilha sonora de vários outros. O mais importante deles, para a obra do Rei do Ritmo, foi o premiado “O amuleto de Ogum” (1974), que se encerra ao som de Jackson cantando “Revendo amigos” (Jards Macalé/Waly Salomão), gravada especialmente para a ocasião. A trilha dessa película também contém a música “Sim ou não”, interpretada pelo próprio autor, Geraldo Gomes Mourão, o Cícero, irmão de Jackson do Pandeiro (que faz a segunda voz na canção). Outras produções em que Jackson teve canções incluídas na trilha sonora:

1975 – “Pedro Bó, o caçador de cangaceiros”, com a música “Coco do Norte” (Rosil Cavalcanti);
1985 – “Bajado: um artista de Olinda”, com a música “Sou eu o teu amor” (Alceu Valença/Carlos Fernando), em dueto com Gilberto Gil;
2002 – “Deus é brasileiro” (2002), com “O canto da ema” (João do Vale/Alventino Cavalcanti/Ayres Viana);
2003 – “Benjamim” (2003), com “Sebastiana” (Rosil Cavalcanti);
2003 – “Raízes do Brasil II”, com “Ele disse” (Edgar Ferreira);
2003 – “Pelé eterno”, com “O Rei Pelé” (Jackson do Pandeiro/Sebastião Batista);

Em 1978, Jackson do Pandeiro foi também tema de um pequeno documentário, um cineclipe intitulado “A brasa do norte”, dirigido por Ivan Cardoso. Já em novelas, teve a canção “A feira” (Nonato Buzar/Mônica Silveira) incluída na trilha de “Pigmalião 70”, exibida pela rede Globo em 1970.

 

Briga em Recife

Uma temática comum nas letras do repertório de Jackson do Pandeiro era a narração de brigas, confusões e causos de valentões. “O desordeiro” (Maruim), “Lei da compensação”(Rosil Cavalcanti), “A mulher do Aníbal” (Genival Macedo/Nestor de Paula), “Cabo Tenório” (Rosil Cavalcanti), “Forró de Surubim” (José Batista/Antônio Barros), “À base de bala” (Maruim/Oscar Moss) e “Forró em Caruaru” (Zé Dantas) são alguns exemplos. Na vida de Jackson também houve um fato que poderia virar letra de forró.
Contratado em 1955 para fazer uma apresentação na residência de Eládio de Barros Carvalho, ex-presidente do Clube Náutico Capibaribe, no bairro da Tamarineira, em Recife/PE, onde vários atletas e dirigentes do time realizavam uma comemoração, Jackson foi tirar satisfação na festa com Guerra de Holanda, cronista do periódico Folha da Manhã, que soltava pilhérias para sua esposa Almira, chegando ao ponto, inclusive, de passar a conhecida “mão boba” na artista. Um jogador do Náutico tomou as dores do jornalista e passou a discutir com Jackson. Foi o suficiente para vários atletas da equipe partirem para cima do indefeso cantor com chutes, socos e cadeiradas. Jackson e Almira tiveram que se retirar às pressas do local, ele com o rosto ensanguentado e com séria lesão em um dos olhos, que quase o deixou cego, e ela com a roupa rasgada pelas agressões.
Posteriormente, Jackson atribuiu o fato como um dos motivos que o fizeram deixar Recife definitivamente, magoado com a falta de providências por parte das autoridades.

 

Universo em desencanto

Em sua música, Jackson do Pandeiro explorou a religião em vários momentos. Canções natalinas, homenagens a santos, músicas sobre o candomblé, tudo isso faz parte do repertório jacksoniano. De todas, talvez a mais polêmica seja a fase em que o paraibano foi adepto do Universo em Desencanto, também conhecido como Cultura Racional, espécie de doutrina criada e pregada por Manoel Jacinto Coelho, autor do livro que detalhava os princípios da teoria, segundo ele, ditados por um ser extraterreno, o “Racional Superior”. A obra, inclusive, chegou a figurar entre as mais vendidas no país nos anos 70, e a filosofia virou tema de um documentário semanal televisivo, apresentado pelo músico e produtor João Roberto Kelly, durante vários anos daquela década. Lady Francisco, Procópio Ferreira, Lúcio Mauro e, principalmente, Tim Maia, além de Jackson, foram nomes conhecidos que integraram a seita – Manoel Jacinto costumava dizer que a Cultura Racional não era seita, filosofia ou religião, mas sim um “conhecimento das origens da humanidade”. Enquanto Tim Maia chegou a gravar dois discos inteiramente dedicados à divulgação do Universo em Desencanto, Jackson do Pandeiro lançou apenas 4 músicas sobre o tema, entre 1974 e 1978: “Mundo de paz e amor” (Zito de Souza/Alexandre Alves), “Acorda meu povo” (João Cruz), “Alegria minha gente” e “A luz do saber” (as duas de autoria de João Lemos). Em comum com Tim Maia, a excelente qualidade no balanço e no instrumental das canções.
O Rei do Ritmo permaneceu ligado à doutrina até o final dos anos 70, quando foi, aos poucos, deixando de frequentar a comunidade sem, aparentemente, um motivo específico.

 

Polêmica com Flávio Cavalcanti

Em 1957, o apresentador e jornalista Flávio Cavalcanti comandava na TV Tupi o programa Um instante, Maestro!, onde um dos quadros consistia na quebra simbólica de um disco quando uma música era considerada ruim. Em um desses programas, Flávio avaliou a composição “Hotel do Zeferino”, de autoria de Rosil Cavalcanti, atribuindo sua gravação a Jackson do Pandeiro, seu colega nas Emissoras Associadas. No periódico Diário Carioca, onde possuía uma coluna, Flávio Cavalcanti publicou a letra da música e escreveu as seguintes palavras sobre a composição:
“…isto aqui é uma coisa que se chama “Hotel do Zeferino”, que o sr. Jackson do Pandeiro, das Associadas, gravou em discos Copacabana (…) É preciso rasgar coisas assim. Em nome da música popular brasileira. É preciso rasgar partituras que contenham letras assim. E nesse papel rasgado, e nesse disco quebrado, fica uma desforra da boa, da incomparável música brasileira.”
O problema é que Jackson do Pandeiro não havia gravado a canção, embora realmente tenha recebido a letra junto com outra dezena de canções enviadas por Rosil Cavalcanti. Era costume do compositor enviá-las ao amigo sempre que compunha. As composições foram, então, encaminhadas à Copacabana para que providenciassem a liberação, ganhando tempo com o processo. Uma funcionária da gravadora adiantou-se e liberou as letras para a revista “Modinhas Populares”, que publicou a composição como se já estivesse gravada por Jackson. O cantor paraibano, ao saber das críticas de Flávio Cavalcanti a sua pessoa por conta dessa música, defendeu-se no programa em que atuava pela própria TV Tupi, “Festa no Arraial”, com palavras pouco amistosas ao seu colega. A contenda resultou em uma suspensão de Jackson nas Associadas, culminando com o seu pedido de rescisão. “Fiquei frio de raiva e de vergonha, pois sempre me orgulhei de ter um repertório limpo e faço questão disso principalmente: manter meu repertório limpo e elevado. Em vista disso, e como a Tupi não tomava qualquer providência para salvaguardar meu nome, pedi a rescisão de nosso contrato (junto com Almira) com as Associadas”, declarou Jackson.
Após o episódio, Flávio Cavalcanti reconheceu o erro, admitindo-o como um mal entendido e pedindo explicações ao diretor da “Modinhas Populares” sobre os critérios utilizados para a publicação de uma canção naquela revista. Eis a letra de “Hotel do Zeferino” (Rosil Cavalcanti):

O hotel do Zeferino
Não há cristão que aguente
Tudo é fraco tudo é frio
Só a mulher dele é quente

O freguês pede um filé
Só vem carne de pescoço
E se pede feijoada
Ninguém gosta, ninguém quer
A comida é ruim demais
De bom só tem a mulher
Zeferino sabe tudo, bota a mulher pra servir
Se a turma dá gorjeta, Zeferino só faz rir
O hotel faz bom negócio, e o lucro tá na vista
Só porque a mulher dele é bonita e vigarista

 

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Jackson do Pandeiro “atravessado na garganta” com Flávio Cavalcanti. Foto: Revista do Rádio, 1957, ed. 00413.

 

Discografia

Ao longo de sua carreira, Jackson do Pandeiro gravou mais de 430 canções, contidas em 29 Lps de carreira e centenas de outros discos, entre compactos e coletâneas diversas. Ainda não se pode chegar a número exato de gravações em razão de haver registros impressos de canções atribuídas a Jackson cujos áudios não foram localizados. Além disso, não há uma homogeneidade nos critérios adotados entre os pesquisadores para se incluir uma gravação na lista. Inaldo Medeiros, autor do livro “A musicalidade de Jackson do Pandeiro” (Editora IGP, 2011), que tem como foco a discografia do artista, optou por deixar de fora da relação das músicas a canção Tarima (Nivaldo Lima/José Gomes) apenas porque a primeira voz é executada por Almira Castilho. Da mesma forma, a música Chico Bendengó (Ayres Viana/Uzias Da Silva/Alventino Cavalcanti). Há que se destacar ainda que Jackson do Pandeiro também cantou em discos de outros artistas, como Abdias, quando fez a voz principal de “Forró do Regatão” (Araponga do Rojão/Antônio Bispo) no LP “Forroriando”, de 1973. Outro aspecto a se considerar é em relação aos registros de canções executadas por ele em vídeo, como filmes ou programas televisivos, sem a respectiva gravação em disco.
Após grande período de descaso do mercado fonográfico, boa parte do acervo jacksoniano foi relançado em cd, principalmente através do box “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, produzido por Rodrigo Faour e lançado em 2016 com 235 faixas do artista em ótima qualidade sonora. Por questões de direitos autorais, porém, apenas 2 álbuns foram reeditados na íntegra nessa caixa: “Aqui tô eu” (1970) e “Isso é que é forró” (1981). Outro box disponível é o “Jackson do Pandeiro – Anos 60”, que trouxe para o cd 3 lps completos (“O cabra da peste”, de 1966, “A braza do Norte” – brasa grafada com “z” mesmo, de 1967, e “É sucesso”, de 1968), além de uma coletânea com raridades. O problema dessa caixa está na baixa qualidade do áudio da maioria das canções. Outros lps de Jackson que possuem edição em cd são “Forró do Jackson” (1958), “Jackson do Pandeiro” (1959) e a coletânea “Sua Majestade o Rei do Ritmo” (1960). O restante são seleções organizadas e lançadas após seu falecimento. A maior lacuna em compact-disc se refere aos álbuns gravados na década de 70.
Praticamente tudo da obra de Jackson que foi disponibilizado em cds também está disponível em plataformas de streaming, como Deezer, Spotify, Apple Music etc.

 

Bibliografia sobre o Rei do Ritmo

Ao se falar em obras escritas sobre Jackson do Pandeiro, a primeira memória remete, claro, à principal delas: a biografia “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”, escrita pelos jornalistas Fernando Moura e Antônio Vicente e lançada pela Editora 34 em 2001. Fruto de um trabalho de aproximadamente 10 anos de pesquisas, a obra disseca, com uma narrativa brilhante, a vida do artista paraibano desde sua infância em Alagoa Grande até o falecimento em Brasília, no ano de 1982. Além disso, em tempos onde as fontes de pesquisa sobre Jackson na internet ainda eram escassas, apresentou uma discografia quase que completa do músico, que serviu de base para que outros pesquisadores pudessem se debruçar e aprofundar seus estudos sobre o legado fonográfico do renomado pandeirista. Enfim, é leitura obrigatória não somente para quem busca saber um pouco mais sobre a vida e obra de Jackson do Pandeiro, mas também para todos que apreciam a boa música brasileira.

 


Livro “Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo”

 

Além da biografia citada, Fernando Moura foi o responsável, no ano 2000, pelo texto e edição do suplemento de nº 32 da série “Paraíba – Nomes do Século”, da Editora A União, que teve como tema o Rei do Ritmo. Jackson do Pandeiro também foi o personagem de outras duas obras:
– “A musicalidade de Jackson do Pandeiro”: de autoria de Inaldo Soares, foi lançado pela editora IGP no ano de 2011. O livro tem como foco a discografia de Jackson, elencando, em ordens cronológica e alfabética, os discos e canções gravados pelo músico paraibano.
– “Jackson do Pandeiro em quadrinhos”: com roteiro de Fernando Moura e ilustrações de Megaron Xavier, faz parte do vol. 9 da série Primeiras Leituras, da Patmos Editora. Lançada em 2016, a publicação é voltada principalmente ao público infanto-juvenil, narrando, de forma didática e ilustrada, a trajetória de Jackson do Pandeiro.
Tema constante de obras da literatura de cordel, Jackson também foi abordado academicamente, servindo, por exemplo, como tese para o Doutorado em Música de Cláudio Henrique Altieri de Campos, pela UNESP, em 2017, e como dissertação para o Mestrado em História de Manuela Fonseca Ramos, pela UFPB, em 2012.
Os livros a seguir são exemplos de algumas publicações que não têm como abordagem central o paraibano de Alagoa Grande, mas possuem capítulos ou partes dedicados a ele:
– “A canção no tempo – 85 anos de músicas brasileiras – volume 1: 1901-1957 (Severiano, Jairo; Mello; Zuza Homem De. Editora 34, 1997);
– “A canção no tempo – 85 anos de músicas brasileiras – volume 2: 1958-1985 (Severiano, Jairo; Mello; Zuza Homem De. Editora 34, 1998);
– “Os 100 melhores CDs da MPB (Domingues, André. Sá Editora, 2004);
– “Forró de cabo a rabo” (Anísio, Ricardo. Editora Bagaço, 2012);
– “O fole roncou: uma história do forró” (Marcelo, Carlos; Rodrigues, Rosualdo. Zahar, 2013);
– “101 canções que tocaram o Brasil” (Motta, Nelson. Estação Brasil, 2016).

 

Homenagens em discos e canções

O maior legado de Jackson do Pandeiro, além de seus discos e gravações, claro, foi a influência que exerceu e ainda exerce sobre os artistas de diversos gêneros da música brasileira. A divisão vocal, o ritmo, a desenvoltura e personalidade com que passeava pelos mais variados estilos da nossa música serviram de espelho e inspiração para inúmeros músicos.
Nomes como Jacinto Silva, Gilberto Gil, Chico Buarque, Genival Lacerda, Alceu Valença, João Bosco, Jarbas Mariz, Zé Ramalho, Elba Ramalho, Gal Costa, Silvério Pessoa, Biliu de Campina, Tom Zé, Fuba de Taperoá declararam publicamente sua admiração pelo Rei do Ritmo e buscaram incorporar em suas discografias elementos característicos do cantor paraibano. Até mesmo artistas de outros gêneros, como Marcos Valle, representante da bossa nova, e a turma da Nação Zumbi e Herbert Viana, nomes do rock nacional, também reverenciaram Jackson. O cd “Jackson do Pandeiro revisto e sampleado”, que trouxe regravações por nomes O Rappa, Gabriel O Pensador, Fernanda Abreu e The Funk Fuckers, é um exemplo clássico disso. Tamanha exaltação resultou em diversos discos e canções gravados em homenagem a Jackson do Pandeiro ao longo dos anos.
Para este 2019, quando se comemora o centenário de nascimento de Jackson, esperava-se a gravação de vários álbuns em sua homenagem, porém, até o mês de julho, não se teve notícia de nenhum lançamento importante. É verdade que os lançamentos fonográficos atuais não dão mais aos músicos o mesmo retorno financeiro de outras épocas, em razão das mudanças nos modos de consumo musical, porém, o principal motivo da falta desses tributos só pode ser um: cantar igual ou próximo ao Rei do Ritmo não é para qualquer um!

A seguir, alguns discos já lançados em anos anteriores em tributo a Jackson do Pandeiro ou explorando seu repertório:

– “Tributo a Jackson e Rosil”, de Biliu de Campina (1989);
– “Forró que não acaba mais – Tributo a Luiz Gonzaga & Jackson do Pandeiro”, Banda Umbuzada (1994);
– “Revivendo Jackson do Pandeiro”, de Fuba de Taperoá (1995);
– “Mastruz com Leite no forró do Jackson do Pandeiro”, com Mastruz com Leite (1996);
– “Marcos Farias interpreta Luiz Gonzaga, Dominguinhos e Jackson do Pandeiro”, de Marcos Farias (1998).
– “Tributo a Jackson do Pandeiro”, de Genival Lacerda (1998);
– “Jackson do Pandeiro revisto e sampleado”, coletânea com vários artistas (1998);
– “Carmélia Alves abraça Jackson do Pandeiro e Gordurinha”, de Carmélia Alves (1999)
– “Forró do gogó ao mocotó”, por Jarbas Mariz (2000);
– “Techno Roots”, por Marco Bosco (2001);
– “Revivendo Jackson do Pandeiro”, de Kojak do Forró (2003);
– “Homenagem a Jackson do Pandeiro”, coletânea com vários artistas ao vivo no Canto da Ema (2003);
– “Batidas urbanas – Projeto Micróbio do Frevo”, de Silvério Pessoa (2005);
– “Forró pras crianças”, coletânea com vários artistas (2006);
– “Ceguêra no samba”, de Ceguêra de nó (2007);
– “Revivendo Jackson do Pandeiro”, com Alberto Jackson (2008);
– “Jackson, pra você tiro o chapéu!”, por Arlindo Moita (2010);
– “Tributo a Jackson do Pandeiro – Ao vivo!”, de Nandinho do Pandeiro (2010);
– “Zé Ramalho canta Jackson do Pandeiro”, de Zé Ramalho (2010);
– “Quinteto Violado canta Adoniran Barbosa & Jackson do Pandeiro”, de Quinteto Violado (2010);
– “Cabeça feita – Silvério Pessoa canta Jackson do Pandeiro”, por Silvério Pessoa (2015);

Abaixo, algumas canções compostas e gravadas em homenagem a Jackson:

– “A imagem do Rei” (João Correia/Haroldo Francisco/Kavaliere), por Kojak do Forró (cd “Catitu fora da manada é comida de onça”);
– “Assim diria Jackson do Pandeiro” (Antônio José), por Antônio José (cd “Assim diria Jackson do Pandeiro, 2008);
– “Bate um balaio ou Rockson do Pandeiro” (João Bosco), por João Bosco (LP Gagabirô, 1984);
– “Canário da Borborema” (Bráulio de Castro/Carlos Magno), por Petrúcio Amorim (cd “Fim de tarde”, 1998) e Bráulio de Castro (coletânea “Pernambucaneando”, 2019);
– “De pandeiro na mão” (Aracílio Araújo), por Aracílio Araújo (cd “Forró sem fronteiras vol. 5”) e Silveirinha (cd “Tocando e Cantando”);
– “Homenagem a Jackson do Pandeiro” (Dominguinhos), por Dominguinhos (lp “Apôs tá certo, 1979);
– “Influência de Jackson” (Guinga/Aldir Blanc), por Leila Pinheiro (cd “Na ponta da língua”, 1998), Marcus Tardelli (cd “Unha e carne”, 2006) e Khrystal (cd “Coisa de preto, 2007);
– “Jack Som” (Marco Bosco/Marcelo Dino/Jackson do Pandeiro), por Marco Bosco (cd “Techno Roots, 2001);
– “Jack Soul Brasileiro” (Lenine), por Lenine (cd “Na Pressão”, 1999) e Fernanda Abreu c/ participação de Lenine (cd “Raio X”, 1997);
– “Jackson no forró” (Severo), por Severo (cd “Severo e Teresa Rios – No forró eu e ela”, 1986);
– “Jackson, o Rei do Pandeiro” (João Biano), por Banda de Pífanos de Caruaru (cd “No século XXI, no Pátio do Forró”, 2003).
– “Memória de um pandeiro” (Arimatéia Pyauí), por Arimatéia Pyauí (coletânea Forró Fest 10 anos);
– “Para Jackson e Almira” (Guinga/Simone Guimarães), por Guinga (cd “Noturno Copacabana, 2003)
– “Pro Jackson do Pandeiro” (Cléber Almeida), por Trio Macaíba (cd “Na trilha do pé de serra”, 2013);
– “Saudades do Jackson do Pandeiro” (Bedeu/Luis Vagner), por Bedeu (lp/cd “Iluminado”, 1993), Oswaldinho (cd “Lição de casa”, 2009), entre outros.
– “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Fernando Sanxo/Sebastião Batista), por Manhoso (lp “Camelódromo, 1985);
– “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Ailton Almeida da Silva/João Jailso Teixeira), por Trio Juazeiro (LP “A volta do Trio Juazeiro, 1993);
– “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Biliu de Campina/Assis do Cavaco), por Biliu de Campina (LP “Tributo a Jackson e Rosil”, 1989) e Fuba de Taperoá (cd “Revivendo Jackson do Pandeiro”, 1995);
– “Tributo a Jackson do Pandeiro” (Olinto Potiguar), por Olinto Potiguar (cd “O povo quer forró”, 1996);
– “Viva Jackson do Pandeiro” (Hermeto Pascoal), por Hermeto Pascoal (cd “Eu e eles”, 1999).

 

Fontes consultadas:

Moura, Fernando; Vicente, Antônio. Jackson do Pandeiro – O Rei do Ritmo. Editora 34, 2001, 1ª edição.
Soares, Inaldo. A musicalidade de Jackson do Pandeiro. Editora IGP, 2011, 1ª edição.
Marcelo, Carlos; Rodrigues, Rosualdo. O fole roncou – Uma história do forró. Zahar, 2012, 1ª edição.
Arquivos da hemeroteca digital da Biblioteca Nacional relativos aos seguintes periódicos: Revista do Rádio, Radiolândia, Jornal do Brasil, Diário Carioca, Diário de Notícias, O Fluminense, O Jornal, Correio Brasiliense, Diário da Noite, Correio da Manhã.
dicionariompb.com.br
discosdobrasil.com.br
forroemvinil.com
immub.org
cinemateca.org.br

Texto – Homenagem a Jackson do Pandeiro, por Abílio Neto

HOMENAGEM A JACKSON DO PANDEIRO
Texto de Abílio Neto

Fico aqui imaginando Jair Bolsonaro discursando na inauguração de Brasília em 21/04/1960 como se o ato fosse transportado para 2019. Será que conseguiria proferir alguma frase pelo menos parecida com esta que reproduzo?

“Deixemos entregues ao esquecimento e ao juízo da História os que não compreenderam e não amaram esta obra”. (JK)

Agora minha imaginação se volta para o ‘diplomata’ Eduardo Bolsonaro, que fala um inglês do tipo “the book is on the table”, ao compará-lo ao verdadeiro diplomata e poeta Vinícius de Moraes, fluente em cinco idiomas, também falando sobre a Novacap:

“De nada valia o pio das aves de mau agouro da imprensa e de alhures, contra o ímpeto maravilhoso do trabalhador brasileiro, que acorreu de todos os cantos do país, especialmente do Norte, para erguer aquelas estruturas adiante do Tempo…” (Vinícius de Moraes, no LP Brasília – Sinfonia da Alvorada, 1961)

Puxa, onde é que entra Jackson do Pandeiro nessa história? Agora. Jackson não trabalhou na construção de Brasília, mas esteve lá, depois de inaugurada, fazendo um show para “os Silva”, os candangos, que naquele tempo podiam trabalhar em grandes construções e hoje, esta grande família, representa a maior parcela da população carcerária do Brasil. Não estou falando de Lula da Silva. Este, apesar do esforço contrário da juíza Carolina Lebbos, teve direito a uma cela de Estado Maior, já os outros vão para celas de presídios que bem representam o Estado menor que insistimos em ser.

Jackson, que se vivo fosse, completaria 100 anos no dia 31 de Agosto passado, fez em parceria com João do Vale (dois negros maravilhosos, como diria o narrador Luiz Roberto, da TV Globo) uma verdadeira poesia sobre aquilo que contemplou em 1960: “ROJÃO DE BRASÍLIA”. Rojão é um gênero musical, mas ali ele quis se referir ao ritmo arrojado de como eram tocadas aquelas obras da nova capital do país. Um verdadeiro rojão. A música, no entanto, é um lindo baião.

Uma coisa que os pesquisadores não falam de Jackson, cujo nome de registro era José Gomes Filho, é que ele foi um grande sanfoneiro de boca (com a boca fazia até arranjos para suas músicas) e também um ótimo violonista rítmico. Ele tocava violão de uma forma diferente de todo mundo.

Na gravação de “Rojão de Brasília”, feita no final de 1960 e lançada em LP pela gravadora Philips no começo de 1961, Jackson se acompanhou do seu violão, e um estudo que fiz de todas as gravações suas me deram a certeza de que apenas em outra oportunidade ele colocou seu violão em estúdio. Um trecho da letra sobre Brasília diz: “o planalto é tão lindo/ que a gente tem a impressão/ que vê ali bem pertinho/ o céu encostar no chão…”

Vendo que as oportunidades de trabalho eram inúmeras no Planalto Central, naquele tempo, ele deixou um recado aos Silva do Norte/Nordeste, no final da letra: “quem tiver de malas prontas/ pode ir que se dá bem/ leve todos cacarecos/ leve seu xodó também/ este conselho é pros homens/ porque mulher lá não tem”. Cacareco aparece grifada de vermelho aqui no meu corretor de texto, é claro, porque cacareco é coisa velha e muito usada de gente pobre que não tem direito a mobília.

Imenso foi Jackson do Pandeiro! Grande compositor e ótimo cantor. Sua voz não era linda como a de Luiz Gonzaga, mas sua maneira de cantar jamais será imitada. O que lhe faltava em beleza vocal sobrava em ritmo e bossa. Aliás, a bossa nova nordestina começou com Jackson cinco anos antes da outra bossa, a de Tom Jobim e João Gilberto, verdadeiros pilares da grande música brasileira em um grau de maior sofisticação musical. E os dois eram doidinhos por Jackson. Quem não era?

Jackson, quando chegou ao Rio de janeiro, em 1953, já era doido pelo samba e introduziu no começo da década de sessenta, o chamado samba de sanfona. Luiz Gonzaga o criticou, mas foi inútil: ele compôs e gravou vários sambas de indiscutível qualidade e com um ritmo que era só seu. O homem era originalíssimo em tudo.

Quis o destino que Jackson morresse num hospital em Brasília, após uma excursão empreendida pelo país. Ele que era diabético desde os anos 60, morreu aos 62 anos, em 10 de julho de 1982, em decorrência de complicações de embolia pulmonar após sofrer um AVC na cidade. Ele gostava de Brasília e tinha amigos lá. Participou de um show uma semana antes de falecer e no dia seguinte passou mal no aeroporto antes de embarcar para o Rio de Janeiro. Ficou internado na Casa de Saúde Santa Lúcia.

Foi enterrado em 11 de julho de 1982, no Cemitério do Caju, na cidade do Rio de Janeiro, com a presença apenas de músicos e compositores populares dos morros cariocas e nordestinos. Nenhum medalhão da MPB foi se despedir dele. Hoje, seus restos mortais repousam na sua terra natal (Alagoa Grande/PB), não no cemitério da cidade, mas em um memorial preparado para tal fim pelo povo alagoa-grandense.

Campina Grande (Alto Zé Pinheiro, Bodocongó), Recife e as ladeiras de Olinda ainda sentem a falta de Jackson. Nesta última, criou com Sivuca e Hermeto Paschoal, no começo dos anos 50, uma troça de carnaval chamada “O Mundo Pegando Fogo”, prevendo a III Guerra Mundial, que, graças a Deus, ainda não foi decretada.

Jackson tem sido injustiçado no ano do seu centenário. Merecia muito mais do que tenho acompanhado. Até nos títulos de nobreza, o seu foi deixado de lado: falam muito do Rei da Voz (Francisco Alves); do Rei da música romântica (Roberto Carlos); do Rei do Futebol (Pelé); do Rei das pistas (Ayrton Senna); do Rei da Bossa Nova (João Gilberto); do Rei do Baião (Luiz Gonzaga) e até do Rei das Coxinhas (restaurante de Gravatá/PE). Mas do Rei do Ritmo (Jackson do Pandeiro) pouco se divulga, mas ele não deve ser olvidado. Deve sim, ser ouvido porque vive e resiste ao esquecimento nas velhas acomodações feitas para abrigar seus LPs nos lares dos seus milhares de fãs (aqueles que ainda vivem!) espalhados por este Brasil.

Selecionei, além do encantador Rojão de Brasília, o arquivo de A Ordem é Samba, Caso de Polícia e Pisei num Despacho (de Geraldo Pereira), estes dois últimos retirados da minha conta do YouTube para ressaltar o lado sambista do paraibano ou ‘paraíba’, segundo Bolsonaro. Já na clássica “História de Lampião”, também em vídeo, a defesa enfática das mulheres ao abordar o martírio de Maria Bonita, morta e degolada pela polícia alagoana: “mulher não nasceu pra sofrer/ E não devia morrer”.

Por fim, um áudio raro: Jackson cantando, ao vivo, em 1980, o frevo de Carlos Fernando e Alceu Valença, intitulado “Sou Eu O Teu Amor”. A gravação tem a sanfona de Severo, também já falecido, e um coro formado por Anastácia e Cátia de França que se apresentavam com Jackson no Projeto Pixinguinha daquele ano. A música era a que fechava o show e o áudio contém a despedida dos três artistas numa noite de Julho. Foi colocado também no YouTube.

Quando Caruaru tinha carnaval, na década de 60, havia um bloco do bairro Salgado que tinha esse nome: Sou Eu O Teu Amor. O popular Cacho de Coco era quem o comandava: uma pequena orquestra de frevo, umas vinte moças daquelas de ‘corpo levanta defunto’, vestidinhas corretamente com pouca roupa, um barricão fazendo a distribuição gratuita de limão com cachaça e o arrastão dos agradecidos fãs da pinga daquela cidade agrestina, bebendo, frevando e espiando as ‘muié’ fazer o passo da tesoura e passar a sombrinha entre as pernas. O bloco passava veloz feito um raio e a música é a sua história. Ô que saudade danada da Caruaru do passado!

Salve os 100 anos de Jackson do Pandeiro, um artista imortal!

Abílio Neto

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CD – Aracílio Araújo – O forró sem fronteira

Colaboração do Aracílio Araújo

Recebi esse disco do próprio Aracílio, mas esqueci de perguntar a data de lançamento. Alguém saberia essa informação?

Participações especiais de Alceu Valença, Paulinho Leite, Santanna, Irah Caldeira e Rogério Rangel.

 Aracílio Araújo – O forró sem fronteira vol.5

01 Saudade imensa (Antonio Barros)
02 De pandeiro na mão (Aracílio Araújo)
03 Vivendo de amor (Aracílio Araújo)
04 Diálogo do amor (Cecéu)
05 Tem mais gente (Demétrius – Reinaldo Fernandes)
06 Paraibano (Aracílio Araújo)
07 Sua presença (Cecéu)
08 Meu girassol (Aracílio Araújo)
09 Maracatuando no forró (Aracílio Araújo)
10 Pra todo mundo (Aracílio Araújo – Jorge Silva)
11 Deixe o rio desaguar (Aracílio Araújo)
12 Compadre Gavião (Aracílio Araújo)
13 Sonhando com o progresso (Aracílio Araújo)
14 Minha bandeira (Aracílio Araújo)
15 Bom timoneiro (Aracílio Araújo)
16 Forró de qualidade (Aracílio Araújo)
17 Itabaiana é meu canto (Aracílio Araújo)
18 Farelin de nada (Xico Bizerra)
19 Essa menina (Aracílio Araújo)
20 De Salgueiro a Petrolina (Aracílio Araújo)

Para baixar esse disco, clique aqui.

Se estiver com dificuldade para baixar e descompactar os arquivos, tire suas dúvidas em nosso manual “passo a passo”, clique aqui.

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